Papo de menina

Por que é tão difícil nos aceitarmos fisicamente?

por Carolina Munhóz
20 de agosto de 2014


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Quando comecei o processo de escrita de O reino das vozes que não se calam, livro que estou lançando em coautoria com a Sophia Abrahão, eu me fiz muito essa pergunta. Ela também me transportou para o passado, e diversos momentos retornaram como um flash. E, sim, é muito difícil se aceitar fisicamente. Ainda mais numa sociedade na qual tudo gira em torno da beleza. Mas será que somos capazes de nos aceitar por completo? Será que um dia as mulheres deixarão de exigir tanto de si mesmas e das outras ao redor? Essas são questões com as quais nossa personagem principal acaba se deparando, e é sobre isso que decidi conversar com vocês.

Com uns 10 anos, descobri em mim algo sério: complexo de inferioridade. Comecei a criticar tudo em mim e a quase me odiar. Definitivamente, eu não era como as outras meninas ao redor, o que fazia com que a minha tortura diária piorasse. Não tinha as roupas de marcas que elas usavam, nem a família de comercial de margarina, muito menos o corpo magro e esbelto, o cabelo liso e a pele de seda. Nada que chamasse atenção. Mesmo na infância, pensamentos desse tipo já afetam a vida de uma menina e, com o tempo, o meu corpo foi ficando menos perfeito. Do rosto nem se fala (ah, a maldita adolescência!), e o mundo parece entrar em guerra contra você. Foi assim que desenvolvi uma “mania” muito ruim: toda vez que me olhava no espelho, apertava meus olhos a ponto de só conseguir enxergar uma figura embaçada, assim não via os detalhes e não me condenava tanto.

espelho

Ouvi por muitos anos que eu não me enquadrava no padrão de beleza no qual as pessoas acreditavam ao redor. Por conta de cobranças assim, já queimei toda a minha panturrilha com chapinha por causa do estresse, o que obrigou a não usar shorts por dois anos. Já manchei meu rosto com produtos que não deveria ter passado e engordei dezesseis quilos em quatro meses (!) quando resolvi matar minha solidão com coelhos de chocolate, aproveitando uma promoção de Páscoa de setenta por cento de desconto nos Estados Unidos.

Com o passar dos anos, porém, e com os exemplos de personagens que lia em meus livros preferidos, percebi que a beleza exterior era algo com o que eu não precisava me preocupar tanto. Sim! É legal se cuidar e ter vaidade até certo limite, mas a Hermione era considerada feia por muitos em Hogwarts e, ainda assim, era linda aos meus olhos. Nem Katniss ou Tyrion eram exemplos estéticos de seus mundos. E vai dizer que você não se apaixonou por Hazel Grace (ok, pelo Gus também)? Comecei a acreditar que eu poderia um dia ser assim aos olhos de outras pessoas. Nesse processo, encontrei a única pessoa importante de fato. Eu consegui me olhar nos olhos pela primeira vez em muitos anos e não tive medo do espelho. Ele só mostrava uma garota confusa, mas que sabia o valor da beleza interior. Se ela não se preocupasse tanto com o que as pessoas pensam de seu exterior, ela poderia descobrir o quanto é bonita por fora.

para post carol munhoz

Escrevendo esse livro e acompanhando mais a vida da Sophia, eu me vi relembrando desses momentos. Percebi que até ela, uma belíssima atriz conhecida e adorada, é surpreendida por comentários em posts do tipo: “ela está magra demais” ou “como tal cabelo está horrível”. Sério! Ela, que eu considero a nossa Emma Stone pela capacidade rara de ficar bonita com qualquer cor de cabelo, também é criticada pela sua aparência. Não há como lutar sozinha com um mundo assim! Mas há como você lutar contra os seus próprios preconceitos. Agora eu pergunto: você já conseguiu se olhar no espelho? Realmente olhar cada detalhe e ficar feliz, aceitando que é uma criatura muito bela? Sim? Parabéns! Chego até a sentir invejinha branca de você e peço que ajude aquela sua amiga que você sabe que é um tanto complexada a se enxergar assim também. Que tal? Hoje pare na frente do espelho e tire alguns minutos para você. Porque sim! Você é uma das pessoas mais lindas deste mundo. Todos nós somos! É isso que importa.

Então não tente enxergar a vida por meio de uma visão embaçada. Procure os detalhes e encontre neles a perfeição.

☛ Leia também:
Como tudo começou: O reino das vozes que não se calam, por Carolina Munhóz.
Leia trecho exclusivo de O Reino das vozes que não se calam.

 

carol munhoz_pequenaCarolina Munhóz

Carolina Munhóz é escritora, jornalista e integrante do maior site de Harry Potter do Brasil, o Potterish, e do podcast RapaduraCast. Eleita a melhor escritora pelo Prêmio Jovem Brasileiro de 2011, lança este mês, agosto, pelo selo Fantástica Rocco, O Reino das vozes que não se calam, escrito com Sophia Abrahão.

 

 

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Comentários sobre "Por que é tão difícil nos aceitarmos fisicamente?"

  1. Carol, concordo tanto com você!
    Esse é um problema sério que muitas garotas enfrentam. Eu também passei por isso, é duro não se enxergar no grupo sucesso da escola, até perdi um namorinho na época de escola para uma das minhas melhores amigas, que eu achava muito mais bonita que eu. Pra acabar né?
    Acho que o que agrava mais ainda são os rótulos, eu era uma menina que amava se arrumar e ao mesmo tempo era nerd, resultado: não cabia em nenhum grupo. Os nerds me achavam cocota demais e as cocotas me achavam nerdinha demais.
    Conquistei meu equilibrio e quando decidi me firmar em uma postura e me aceitar, achei os meus amigos mais verdadeiros que estão do meu lado até hoje! Acho que é muito importante falarmos disso e trocarmos experiências, para que outras garotas não sofram em vão.
    Beijos e sucesso!

  2. Eu acho que complexo de inferioridade também um pouco se dá pelas experiências que você vivencia na adolescência. Como a amiga ali em cima citou, perder o namorado para a amiga que você considera mais bonita (disse considera porque as vezes nem é) é deveras impactante quando se é adolescente. Eu já fui do tipo de olhar no espelho e não se gostar, mas o que me ajudou bastante quando eu tinha meus 14, 15 anos foi a literatura. Sempre via aquelas personagens fortes, corajosas, inteligentes e que não precisavam serem lindas e deslumbrantes (em sua maioria não são) para serem heroínas e fazer grandes coisas na vida (e descolar de quebra o verdadeiro amor). Isso me ajudou a me aceitar e me focar nas minhas qualidades. O que as gurias tem que saber é que beleza é só embalagem, e que não é porque todo mundo acha bonito, quer dizer que aquilo é bonito e pronto. Seja você mesma, sua beleza é só sua e é única, e não há nada mais bonito que se gostar e ser feliz. 😀

  3. Oi Carol! Adorei esse texto, e me identifiquei muito. Acho que essa coisa de complexo de inferioridade acontece com mais frequência do que se imagina. Eu ainda sofro com isso, pra ser sincera, mas já fui bem pior… já fiquei anos sem me olhar no espelho por mais de 10 segundos e só quando era realmente necessário. Ainda não melhorei muito, mas ultimamente tenho feito meu máximo para melhorar, porque sei que não vai me levar à lugar algum, mas como você disse, é muito difícil se aceitar.
    Beijos Carol, estou louca pra conhecer você e ler seus livros! <3

  4. Caramba,A Carol tem a capacidade de mexer com meus sentimentos.Amo ela,me indentifico! Eu tenho a capacidade de ser jugada por todos até mesmo por aqueles que mais amo.

  5. Carol. Adorei sua mensagem, acho incrível esta capacidade de ajudar aos outros com suas palavras. Realmente é um problema bem sério para muitas meninas, nesta injusta sociedade que prega uma perfeição que simplesmente não existe, afinal se fotos de modelos em revistas fossem reais, não existiriam os famosos editores de imagem, maquiagem, etc..etc…Não passei por isto, porque fui uma adolescente “Do Contra” absolutamente de propósito, quanto mais diferente eu era da maioria, mais me gostava, uso óculos desde dos 14 e cabelos seeempre cacheados, apelidos como Beth a Feia, Quatro Olhos, eram comuns, eu tinha uma língua afiada com respostas a altura, ou até bem baixas, e sempre tinha a última palavra. E tinha uma certeza o problema não era comigo, era com os olhos de quem apelidava. Se o normal era se preocupar, estressar, lamentar a aparência, eu queria ser o contrário. Família de renda baixa vivia com roupas ganhadas das primas, então quando todas já usavam calça de cintura baixa, as minhas eram altas da moda de 3 anos anteriores, me zoavam, diziam que era calça “beira boca do estômago”, eu respondi “a minha modela a cintura, a sua vai te deixar barriguda antes dos 20”, viu sempre a língua afiada. Mas sobrevivi a adolescência, não sou exemplo pra ninguém, mas meu orgulho me dava confiança. Hoje com 27 e cinturinha de 98 cm por causa de minha Alice que está chegando, continuo com a mesma confiança de que somos todas lindas, quem pensar o contrário que arrume o que fazer. Admiro sua trajetória e sua superação, e sempre me encanto com o que você escreve. Abraços.

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