
Histórias Mal Contadas
Autor: SILVIANO SANTIAGO
200 pp. | 14x21 cm
Assuntos: Ficção – Conto, Ficção Nacional
Selo: Editora Rocco
E-book
Preço: R$ 18,00
E-ISBN: 978-85-81222-09-7
Depois de ter sido responsável por duas obras de grande repercussão cultural, Intérpretes do Brasil (2000) e a correspondência trocada entre Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade (2002), Silviano Santiago retornou à condição de escritor, publicando pela Editora Rocco o audacioso e aclamado romance O falso mentiroso (2004). Nos últimos meses publicou uma antologia de ensaios sob o título de O cosmopolitismo do pobre (2004) e agora a Rocco entrega às livrarias a sua mais nova coleção de contos, Histórias mal contadas.
Os contos que Silviano chama de histórias mal contadas são os cinco primeiros do livro e tratam, em particular, das experiências concretas, divertidas e sofridas que um jovem universitário brasileiro teve no seu primeiro contato com as sociedades francesa e norte-americana nos anos 1960. Naquela década, a vida em Paris era uma loucura e os estados do sul dos Estados Unidos ofereciam um campo de batalha onde se digladiavam brancos, afro-americanos e chicanos, onde reinavam o preconceito e a intolerância. É daí que surge e se espalha por todo o mundo a premência de uma revolução política e comportamental, que levará de roldão por algum tempo os países do Ocidente.
Esses trabalhos insanos, intrigantes e frutíferos de arqueólogo amador acabam se transformando em contos lapidares daquilo que o próprio autor classifica como "autoficção", um misto de autobiografia e ficção. Quando tudo leva a crer que o próprio Silviano está narrando suas memórias, surgem detalhes que deixam a dúvida. O autor explica: "A ficção nos aproxima muito mais da verdade do que o mero relato sincero (?) do que aconteceu. As histórias mal contadas são relatos escritos por um falso mentiroso, bem semelhante ao narrador do meu último romance" Ou seja, estamos diante de um autor que optou por ficcionalizar a experiência roubada ou dada de presente pela vida e a memória, porque acredita que, através das versões elaboradas literariamente, esteja se aproximando mais da verdade daquele sujeito que é o autor delas e se chama Silviano Santiago.
O conto "Borrão" relata a experiência duma viagem no ônibus Greyhound da cidade de Nova Orleãs, na Louisiana, até Forth Worth, no Texas. No entra e sai do ônibus, onde afro-americanos se misturam com os chicanos, vão-se sucedendo estações rodoviárias, onde banheiros e lanchonetes designados para os brancos estão ao lado de outros designados para os afro-americanos e chicanos. Na dúvida sobre o banheiro e a lanchonete de que se deve valer, o jovem brasileiro acaba sendo obrigado a reconhecer o seu "lugar" de estrangeiro naquela sociedade, ao não ser servido pelos garçons num restaurante de luxo do Texas. Em outro conto, "Vivo ou morto", o narrador revela sua surpresa ao descobrir que sua cabeça fora posta a prêmio pelo FBI, mas este é apenas o ponto de partida de uma história muito mais complexa. "Ed e Tom" aborda com indulgência e carinho duas chagas da sociedade norte-americana, o alcoolismo e a pedofilia.
Os sete contos restantes são histórias apropriadas, em que Silviano – através de um estilo de camaleão – homenageia com honestidade inédita algumas mentes brilhantes do passado, ao mesmo tempo que traça panoramas riquíssimos e inventivos da nossa cultura. Destaque para o conto "Todas as coisas à sua vez", escrito para lembrar os 50 anos da morte de Graciliano Ramos. Um conto jamais escrito pelo romancista alagoano, mas lapidado e auto-irônico como se fosse dele. Confidencia Silviano: "Foi o modo que encontrei poder falar literariamente da minha velhice, da experiência da morte, que ainda não chegou, mas que chegou a ele, da maneira como chegou, e chegará um dia a mim"
Sob o mesmo conceito de história apropriada está "Conversei ontem à tardinha com o nosso querido Carlos", carta supostamente escrita em 1925 por um amigo de Carlos Drummond a Mário de Andrade. A carta, no fundo, nada mais é do que motivo para que se fale das raízes nietzscheanas de uma das máximas de Mário:
"A própria dor é uma felicidade" A maior audácia ficcional está no conto "Caíram as fichas", onde Silviano inventa as 19 fichas que teriam servido de pano de fundo para a famosa conferência que o paulista Mário de Andrade fez no Rio de Janeiro de Getúlio Vargas, em 1942.
Não é por casualidade que Silviano se considera um clonador de seres humanos. Leia-se o conto "Hello, Dolly". Confessa: "A literatura sempre foi um véu diáfano que nos faz enxergar a realidade pelo olhos duma outra pessoa" E continua: "O meu interesse tem sido o de criar personagens inteligentes, criativos e imaginosos, personagens verdadeiros e não as marionetes convencionais que muitas vezes encontramos nas biografias e nas autobiografias"

O AUTOR
Silviano Santiago é um dos mais prolíficos intelectuais brasileiros. Poucos autores conseguiram conjugar tão bem, e de forma tão definitiva, obras ficcionais e críticas. Escritor, poeta, professor, crítico literário e ensaísta, foi três vezes vencedor do Jabuti – com Em liberdade (romance, 1982), Uma história de família (romance, 1993) e Keith Jarrett no Blue Note (contos, 1997). Seu romance Heranças recebeu o Prêmio ABL de Ficção 2009 e ficou entre os finalistas do Jabuti e do Portugal Telecom. Suas obras foram traduzidas para o inglês, francês e espanhol.