A magia está nos detalhes

Uma entrevista com Jim Kay, o artista por trás da primeira edição ilustrada de "Harry Potter e a Pedra Filosofal"*
6 de outubro de 2015


*Artigo de Helen Boyle

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Ilustração por Jim Kay © Bloomsbury Publishing 2015

Se J.K Rowling nos presenteou com um mundo fantástico e, através de sua narrativa tão bem construída, fez com que seus cenários e personagens ganhassem vida dentro e fora de nossas cabeças, você pode imaginar a responsabilidade do ilustrador Jim Kay ao ser convidado para dar contornos à história que há tempos deixou o território apenas da fantasia. Resultado de um trabalho primoroso, Harry Potter e a Pedra Filosofal – edição ilustrada acaba de ser lançada em alguns países (Estados Unidos, Reino Unido e Austrália) e chega ao Brasil, pela Rocco, em 2016. Nas próximas semanas começaremos a receber o conteúdo do livro e esperamos entregar aos nossos leitores um exemplar para ler e, claro, admirar. Confira a entrevista de Jim Kay à Helen Boyle:

“Então recebi uma ligação da minha agente”, conta o ilustrador Jim Kay, “e ela disse: você está sentado? Eles querem você para ilustrar Harry Potter.” Como um grande fã dos livros e do filme, Kay explica, “foi uma oportunidade incrível para recriar o mundo de Harry Potter”.

Mas a maior incumbência da vida também vem com a maior pressão da vida?

“Sim, com certeza. Todos têm uma opinião sobre Harry Potter e é por isso que este projeto é maravilhoso, mas igualmente desafiador. Mas não estou reclamando, esta é uma missão sensacional.”

E Jim Kay gosta de se desafiar. “Um dos meus professores de Arte dizia que devemos nos testar continuamente, sairmos da zona de conforto. E eu sabia que Harry Potter seria difícil para mim: porque envolve crianças, por causa da proporção que esse universo tomou e porque é fantasia. Eu acho que me vejo mais como um gravurista, expressando coisas através de paisagens, mas com Harry Potter eu tive que expressar emoções através dos personagens:

“O mais trabalhoso foram os personagens – eu tive que encontrar os meus próprios Harry, Ron e Hermione. Eu nunca havia desenhado crianças realmente, então eu precisava de referências reais, especialmente porque as crianças crescem ao longo dos livros. Então eu e minha agente tivemos que encontrar crianças para dar forma a meus personagens.”

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Ilustração por Jim Kay © Bloomsbury Publishing 2015

E como foi dar vida a Hogwarts?

“A etapa preparatória, visualizar a ‘arquitetura’ de Hogwarts, tomou muito tempo. Desenhei uma planta baixa de como eu imaginava Hogwarts a partir de referências dos sete livros. Mas quando comecei a pôr um andar por cima do outro, achei complicado entender como eles funcionavam juntos. Então a única solução que encontrei para criar o castelo foi construindo uma maquete para ele. Era o que fazia quando era criança – criava coisas com o Lego para depois desenhá-las. Então fiz maquetes simples de papel e plasticina, e usei como base para os desenhos. Maquetes também são ótimas para trabalhar a iluminação e a relação dos edifícios entre si.”

O Senhor dos Anéis, de Peter Jackson, também teve grande impacto para Kay.

“Sou um grande fã de John Howe e Alan Lee, ambos foram diretores de arte nos filmes da série O Senhor dos Anéis.  Definitivamente fui muito influenciado pela forma como Peter Jackson conduziu a produção dos filmes, envolvendo os artistas para buscar diferentes caminhos criativos. A oportunidade de abordar o universo de Harry Potter assim foi muito animadora e agradável.”

“Não consigo trabalhar em silêncio. Preciso de som ambiente, e tem que ser algo familiar. Então, enquanto trabalhava em Harry Potter, eu deixava os filmes O Senhor dos Anéis no play. Deixava os três filmes rodarem em looping durante todo o dia, então eu conheço o roteiro de cada um dos longas.”

Os estilos e materiais utilizados ao longo do livro vão encantar os leitores por sua variedade.

“Basicamente sou eu tentando encontrar um estilo – mas eu estava sempre mudando de ideia. Muito do trabalho artístico foi feito em aquarela,  e eu mantive as bordas irregulares nas ilustrações. O designer com quem trabalhei disse que eles gostaram disso e quiseram manter no livro, e também usar respingos de tinta nas páginas. Há também alguns retratos feitos no estilo Hans Holbein, porque um dia eu realmente quero fazer retratos a óleo. Então eu decidi fazer retratos a óleo dos professores Dumbledore e McGonagall.

E os fãs de Harry Potter mergulharão em detalhes nas ilustrações.

“Bem, o detalhe é um pouco minha zona de segurança, porque acho desenho livre realmente difícil, enquanto o detalhe é mais fácil de controlar.  Além disso, cresci com os livros de Richard Scarry e adorava todos aqueles detalhes, e acho que crianças gostam de procurar detalhes também.

E ter a liberdade de adicionar seus próprios detalhes ao universo de Harry Potter deve ter sido algo como um sonho de fã que se torna realidade.

“Sim, isso foi incrível. Eu pude construir lojas no Beco Diagonal e mostrei páginas de guias de campo sobre trolls e ovos de dragão. Eu realmente gosto dessas ilustrações porque elas não estão na história e são algo que as pessoas não estarão esperando quando abrirem o livro. Eu queria trazer algo novo nas mãos e o grande diferencial da escrita de Rowling é que ela traz referências sobre todos esses livros. Você pode encher uma biblioteca com todos os livros que ela cita, e que tornam este universo mais real.”

E tem um detalhe especial que Kay gosta de inserir em todos os livros.

“Anos atrás estava na casa do meu irmão no campo, e me deitei num milharal e uma lebre apareceu. Olhei para ela e ela olhou pra mim. Foi uma dessas experiências que marcam, e a lebre é um animal muito especial para mim. Então tento incluir uma lebre em todos os meus livros. Em Harry Potter, ela aparece numa placa do Beco Diagonal.

E você, Kay, tem uma ilustração favorita?

“Gostei de fazer as ilustrações de abertura de capítulo. Minha favorita é a de um capítulo que abre com a escultura em alto-relevo de um porco do mato  num edifício, com pássaros fazendo ninhos numa chaminé. Eu gosto porque foi a única ilustração que funcionou na primeira tentativa. Geralmente, faço quatro ou cinco tentativas para cada imagem.”

O livro também é cheio de pontos de vista interessantes, imagens surpreendentes e perspectivas.

“Sim, gosto de pontos de vista alternativos. Eu me canso de olhar as coisas da minha altura, acho que é sempre bom lembrar como as coisas se pareciam quando vistas da perspectiva de uma criança. Minha imagem de Hagrid, em que ele é esmagado contra o telhado ocupando uma página inteira do livro, é mostrada da perspectiva do Harry olhando para aquele gigante.

E depois de uma tarefa tão grande, ele consegue olhar para o livro como um todo e ficar orgulhoso do trabalho?

“Como muitos ilustradores, tenho o hábito de focar nas coisas que eu gostaria de alterar. Mas, dito isso, olhando agora, é legal porque representa uma abordagem diferente, com uma mistura real de coisas, estilos e perspectivas, e realmente gosto disso – gosto da brincadeira toda. Além disso, foi um projeto tão grande que acabei me esquecendo de muita coisa que desenvolvi para chegar a isso. Então, olhando novamente foi como ‘Uau, eu fiz muita coisa, não’?”.

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Ilustração por Jim Kay © Bloomsbury Publishing 2015

 

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